Uma lembrança longínqua, não sei ao certo a minha idade, talvez cinco ou seis anos. Lembro-me dos detalhes da sala, do tapete em que eu ficava deitada em almofadões, com as minhas botas vermelhas, a poltrona do “papai” como era chamada, aquele lugar que só o meu avô podia sentar, ao lado de uma mesinha com tampo de mármore, sempre com um copo de cerveja Skol e uma latinha ao lado, em frente a uma TV. Não lembro quase nada dessa época, algumas coisas muito pontuais, talvez por tantas vezes ver as fotografias, no tempo que morei no apartamento dos meus avós, na Gonçalo de Castro, enquanto a nossa casa era construída, em um condomínio ASBAC, na Granja Comary, em Teresópolis. Mas lembro que andava pelos calçadões de Copacabana com os meus três anos de idade, lembro do balanço na pracinha Serzedelo Correia, quando, recém-chegada de Recife, onde nasci, aprendi a amar aquele bairro. Pai pernambucano, mãe e avó cariocas e avô paulista (não sei porquê, mas sempre lembro do Chico Buarque quando me refiro a minha família). Passamos uns dois anos no Rio e depois nos mudamos para ter uma vida mais tranquila, na região serrana, onde meus bisavós tinham casa, e era o local de férias preferido da minha mãe, enquanto meu pai se ausentava muito, por causa do trabalho.
Mas comecei a escrever pensando em outa coisa: futebol.
Esparramada no tapete, acompanhava os jogos que o meu avô assistia e seus comentários, um tricolor doente. Gostava daquilo. Mas aquelas cores não me chamavam muito a atenção. Meu irmão, companheiro de muitas brincadeiras (sempre bem masculinas) era do Botafogo e eu achava também muito sem graça aquela roupa que ele usava branca e preta. Na época só conhecia três times: o Fluminense do meu avô, o Flamengo que meu avô xingava e o Botafogo, do meu irmão. E decidi ser Flamengo. Acho que sempre fui rebelde e teimosa e queria contradizer todos, ou criar um clima mais interessante de disputa, entre os torcedores masculinos da minha família, e cresci sendo Flamengo. Só em 1981, com onze anos, percebi a força do meu time, com um tal de Zico, que era elogiado até pelo meu avô e achava engraçado chamarem ele de Galinho de Quintino. Mais tarde, adolescente, conheci outros Flamenguistas e a minha melhor amiga, ainda hoje, que apesar de viver já há mais de dez anos nos Estados Unidos, sempre lembra de enviar alguma mensagem, quando o Flamengo vence algum campeonato. E a minha mãe, nesses anos todos, que fôra uma tricolor silenciosa e depois começou a ter simpatia pelo Palmeiras, que era o meu segundo time, mas só de vez em quando, quando não jogava com o Flamengo, sempre me felicita pelas ousadias do meu time. Meu irmão abandonou o Botafogo e sinceramente, nem sei mais qual o time que torce, mas nunca esquece de implicar quando o Flamengo perde.
É muita gente sempre soube que o meu sangue desde pequena é rubro-negro. Nesses anos todos, agora com cinquenta, nunca deixei de torcer e enaltecer o meu Flamengo, mesmo quando estamos de mal e o deixo de lado, por uns tempos, ou resmungo impropérios, pois é por amor, e posso, por me sentir no direito, durante todos esses anos de lealdade e fidelidade reclamar quando a coisa não corre bem. Tem momentos que marcaram a minha estória de torcedora, mas deixo para contar nas próximas prosas. Nessa, a intenção é dar os primeiros passos e buscar lá na minha caixinha das lembranças, essa coisa boa, que só quem gosta e torce por um time, sabe como é.
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