Um dos aspectos mais interessantes de acompanhar de perto as análises feitas por comentadores brasileiros aos jogos das suas competições reside na diferente reflexão que é feita e que não estamos habituados na europa, especialmente em Portugal.
Enquanto por aqui se comenta o desempenho individual tendo em conta o interesse colectivo, levando em consideração o género de competição e as especificidades de cada partida, no Brasil é mais frequente avaliar-se o rendimento individual de acordo com a idade, o percurso e o potencial de cada jogador sem considerar as necessidades das equipas, tanto pelo tipo de competição como pelos obstáculos que cada adversário pode colocar.
Aqui analisa-se o trabalho de um técnico não só pelos resultados, mas também pelo percurso evolutivo da equipa, pelo desempenho global dos atletas, pela forma como consegue ultrapassar os obstáculos que cada competição coloca e, acima de tudo, como se adequa e gere os diferentes momentos de um jogo, de uma competição, e até de uma época. No Brasil avalia-se o trabalho dos treinadores pela sequência de resultados, pela utilização deste ou aquele jogador, e pelo estilo de jogo.
Passemos a exemplos concretos e demonstrativos das diferenças atrás referidas:
SOBRE
JOGADORES
No momento que escrevo estas linhas o Sporting está na liderança do campeonato português, com um plantel de 24,9 em média de idade, sendo que a maioria dos jogadores utilizados tem menos de 25 anos. A necessidade do clube obriga à utilização mais frequente de jogadores da formação e todas as avaliações feitas pelos comentadores têm esse factor em consideração. Nenhum resultado é justificado pela juventude da equipa, ou inexperiência, mas sim pelo desempenho a cada jogo. E quase a totalidade dos analistas aplaude a utilização destes jovens, mesmo quando as coisas correm menos bem.
No outro lado do atlântico temos a equipa do Palmeiras que, também por génese e filosofia, dá importância aos jogadores formados no clube e existe uma permanente exigência na sua utilização, por parte dos comentadores desportivos. A média de idades é de 26,6 e oito dos jogadores utilizado no plantel têm menos de 23 anos. No entanto, antes do recente jogo contra o River Plate, em Buenos Aires, a utilização de três desses jovens na equipa titular (jogaram de início 5 jogadores com menos de 25 anos) gerou uma série de comentários depreciativos porque, na opinião de alguns, nestes jogos da Libertadores, os clubes devem alinhar com jogadores mais experientes.
SOBRE
TREINADORES
Continuando com o exemplo do Sporting e também devido à sua política de formação, a aposta foi feita num treinador jovem, mas com um bom trabalho no clube anterior. As avaliações, apesar do currículo curto, têm sido feitas de acordo com os resultados da equipa, as diferentes convocações, a evolução do desempenho de todo o plantel e a forma como tem sabido contornar os obstáculos que cada jogo e cada adversário têm apresentado.
No Brasil temos o exemplo do Rogério Ceni (técnico do Flamengo e quanto a mim o único treinador brasileiro com fortes possibilidades de um dia vir trabalhar na europa) que foi apelidado pela imprensa brasileira como sendo o técnico de maior futuro no Brasil e que tem sido criticado tanto por colocar alguns jogadores em campo como por os deixar fora da titularidade. Também tem sido acusado de falta de reportório táctico e, com mais naturalidade do que seria recomendável, tem visto ser posta em causa a sua capacidade como treinador por três resultados negativos consecutivos.
Resumindo: É extremamente interessante ouvir os comentadores brasileiros quase exigindo a utilização de jovens nas equipas, mas criticarem a sua utilização em determinados jogos porque avaliam à priori as performances pela experiência dos jogadores sem ter em conta as necessidades momentâneas das equipas.
É extremamente interessante ouvir comentadores brasileiros falarem da necessidade de dar-se tempo aos treinadores para fazerem os seus trabalhos e ao fim de meia dúzia de maus resultados colocarem em causa as capacidades do técnico.
É extremamente interessante ouvir os comentadores brasileiros afirmarem que o colectivo deve sobrepor-se ao individual e depois criticarem um técnico por convocar um jogador e voltar a criticá-lo por não convocar o mesmo jogador.
Enfim, o futebol brasileiro também é diferente na forma de ser visto e analisado.
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