Cada dia que passa, mais me convenço que, por aqui, nós queixamo-nos de barriga cheia. As nossas competições são ganhas sempre pelos mesmos e, invariavelmente, seja qual for a situação, há alguém a manifestar, com mais ou menos razão, desagrado.
Mas se olharmos para o panorama futebolístico do Brasil, onde os técnicos e os jogadores vão de bestiais a bestas numa fracção de segundo, devíamos reformular alguns conceitos e admitir que o nosso futebol é paradisíaco.
Neste final de semana, durante os jogos América x Botafogo (sábado) e Corinthians x S. Paulo (domingo) acompanhei as reacções, de adeptos e comentadores desportivos, em alguns canais do Youtube e, pasme-se quem não conhece a realidade canarinha, as vozes da discordância fizeram-se ouvir, alto e bom som, desde o apito inicial de cada partida. Mas vamos por partes.
No jogo do Botafogo, equipa comandada pelo Luís Castro, mesmo sabendo que o projecto do norte-americano Textor é para concretizar a médio/longo prazo, e que a equipa ainda está em fase de construção e, por isso, em fase de adquirir os conceitos do treinador português, o início de partida menos exuberante levou à tradicional “cornetagem” e foram muitos aqueles que colocaram em causa as qualidades técnicas, e capacidade de entendimento do futebol, de Luís Castro. É evidente que o início promissor no Campeonato levou a uma onda de entusiasmo, junto dos adeptos e, sendo natural que estes reajam de forma passional, o mesmo não seria de esperar por parte dos analistas. Todas as opções foram colocadas em causa: porque errou nesta convocação, porque não devia colocar este em campo em detrimento daquele, porque ainda não entendeu as características deste nem os defeitos do outro. Enfim, uma miríade de opiniões acirradas, no sentido de coisa nenhuma.
Já no clássico Corinthians x S. Paulo, o golo forasteiro, marcado nos acréscimos da primeira parte, teve o condão de colocar o treinador do S. Paulo, Rogério Ceni, num pedestal, tal a inteligência tática demonstrada, e o português Vítor Pereira como o pior técnico do mundo, por não conseguir ganhar um clássico nem tampouco entender a importância deste tipo de jogos. O empate final alterou todas as opiniões: Ceni passou a ser chamado de mentecapto e, mais uma vez, tinha demonstrado não ser o homem certo para liderar a equipa, enquanto Vítor Pereira, mesmo estando, contra todas as previsões de início de campeonato, na liderança da competição, é um técnico fraco, sem entendimento do futebol brasileiro e com pouca, ou quase nenhuma, capacidade de liderança.
Repito, vindo de adeptos, cuja paixão exacerbada muitas vezes se sobrepões à razão, este género de reacções podem ser consideradas normais, no entanto, quando proferidas pelos analistas/comentadores, o caso muda de figura.
Para os menos atentos ao futebol brasileiro, os dois exemplos que referi, por terem dois técnicos portugueses como protagonistas, podem transmitir a ideia que é resultado de algum cooperativismo primário, contudo, mesmo não negando a existência dessa realidade, a verdade é que ela é transversal a todos os jogos, independentemente da nacionalidade dos treinadores, do nome dos jogadores, dos clubes ou das competições em disputa. Este comportamento é generalizado. Atrevo-me mesmo a dizer que está pejado de aculturamento; faz parte do ADN.
Bem vistas as coisas, a explicação mais lógica, porque real e evidente, reside no tempo que vivemos, em que a urgência da informação é permanente e, para se manterem audiências, melhor que a informação, resulta a especulação e a polémica mediática. E se, entretanto, o panorama muda, basta uma reformulação, instantânea como café, porque as repercussões do anteriormente dito foram superadas pelo agora.
E assim é visto e tratado o futebol brasileiro, pelos brasileiros, porque é penta campeão mundial.
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