Muitas vezes hesito em escrever sobre as questões que envolvem Abel Ferreira, enquanto treinador do Palmeiras, porque pode dar a sensação de que estou armado em seu defensor público e que sinto todas as dores dele.
A verdade é que não sinto uma, mas fica complicado não reagir à onda de ataques que tem sofrido, desde o momento em que aterrou no Brasil.
Já escrevi muito sobre as acusações que lhe fizeram. Já escrevi outro tanto sobre o incómodo que tem gerado, no entanto, quando penso que está tudo dito, lá aparece mais um ressabiado a disparar sentenças contra o técnico luso levando-me a reflectir e escrever sobre.
Para início de conversa, repetindo-me, e para que tudo fique contextualizado, existe uma enorme diferença, entre brasileiros e europeus, na forma de abordar as temáticas do futebol. Continuo a não saber qual é a mais correcta, contudo, talvez por aculturamento, prefiro a europeia, mais na avaliação técnica e tática do jogo e do colectivo do que nos aspectos laterais e individualistas.
Posto isto, não cometo nenhuma heresia se disser que a maioria das polémicas em torno de Abel Ferreira começa nas suas conferências de imprensa pela falta de paridade no entendimento de futebol, entre o treinador luso e os jornalistas.
Por um lado, os jornalistas brasileiros nunca foram habituados a falar de aspectos concretos dos jogos e sempre que tentavam fazer esse género de questionamento eram hostilizados pelos técnicos, como estivessem a intrometer-se no trabalho dos mesmos.
Entretanto aparecem novos treinadores, com postura diferente, que não têm problema algum em falar de questões táticas e técnicas, porque na Europa é normal os treinadores falarem disso, inclusive entre a classe, e, mesmo sendo uma lufada de ar fresco que agrada aos jornalistas, a verdade é que a falta de hábito leva-os a fazer múltiplas interpretações, de acordo com aquilo que julgam ser o interesse público.
É aqui que aparecem as polémicas. Aquele que sempre aborda questões concretas de jogo, sem tabus, faz uma análise básica e logo alguns a transformam em crítica pública sobre o trabalho do treinador adversário. E o assunto é tão explorado que acaba transformando-se em folhetim, dando espaço para que surjam os oportunistas famintos de aparecer nas parangonas, porque de outro modo ficam limitados ao ostracismo.
Numa outra perspectiva, e porque o momento é propício, os êxitos desportivos de Abel Ferreira, no comando do Palmeiras, também geram debates laterais por conta da forma como os brasileiros discutem a sucessão do seleccionador nacional. Para eles os nomes são cogitados de acordo com os resultados e o treinador da moda acaba por ser o mais falado.
O problema é que, desde 2019, os melhores treinadores no Brasil têm sido estrangeiros. Isso têm gerado muitos debates e, como consequência, muito incómodo por parte dos treinadores do país.
E a revolta de alguns, em nome de todos, podendo até ser entendível, acaba por ser extrapolada de sentido pelos argumentos usados, como se tivesse sido o próprio Abel a oferecer-se para o cargo. Algo que, sinceramente, não creio que esteja nos seus planos imediatos, mas que, caso ele o dissesse abertamente, seria mais material de debate e, com toda a certeza, serviria de motivo para o criticar por “desrespeito à grandeza do escrete”. Adiante.
Abel Ferreira não é santo e muitas vezes até exagera, no entanto, em todas as ocasiões tem sido coerente nas suas opiniões e assertivo na forma como pensa, fala e aborda o futebol. A mim pouco importa se ele aperta, ou não, a mão deste ou daquele treinador. A mim pouco interessa a postura na linha lateral, se salta, grita, gesticula ou usa vernáculo.
Para mim o foco deveria estar no facto de Abel Ferreira abordar questões que, no Brasil, só são faladas de forma rasa, quando são faladas. Na minha forma de entender o futebol, os treinadores brasileiros deveriam deixar de ditar sentenças “à La Palisse”, porque todos sabemos que o Abel não inventou o futebol nem foi para o Brasil ensinar ou ser simpático, mas se o escutarem e debaterem, seriamente, os temas lançados por ele, talvez consigam aprender alguma coisa e aqueles clubes que agora preferem estrangeiros voltem a apostar na prata da casa.
Em vez de filosofia barata e discursos de “damas ofendidas” alguns treinadores brasileiros deviam dedicar mais tempo a estudar as razões que permitem ao Abel Ferreira ter sucesso onde eles nem sequer conseguem chegar.
Abel Ferreira não tem de provar o seu valor em mais nenhum lado. O valor dele está no trabalho realizado no Palmeiras. E tem provado que é treinador para esse clube, ao contrário de outros.
Abel Ferreira tem provado o seu valor ao transformar jogadores, que eram vistos como fracassos individuais, em nomes sonantes do futebol brasileiro. Compare-se o que era falado de Rafael Veiga, Zé Rafael, Scarpa, Rony, Marcos Rocha, etc, (e a lista é enorme) ao que hoje se diz deles.
Para terminar este texto, que é o maior que já escrevi para o blogue, quero fazer referência a vídeos, que podem ser encontrados no Youtube, de adeptos de vários clubes brasileiros, que não palmeirenses, a dissertarem sobre a última polémica gerada em torno do treinador português.
Tendo em conta o grau de clubismo que é reconhecido aos adeptos brasileiros, não deixa de ser interessante verificar que a maioria esmagadora não se revê nas atoardas lançadas por alguns treinadores do país e admite que o trabalho realizado por Abel Ferreira é substancialmente superior ao dos técnicos locais, que sempre fizeram as coisas de forma cooperativista para manter o mercado interno aberto.
Assistir a estes vídeos faz-me reforçar a ideia de que a cada ataque, ao treinador luso, os técnicos que o fazem estão a dar tiros nos próprios pés.
O pior é que estes Cains frustrados nem se apercebem disso.
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