Infelizmente, a única e indesmentível verdade é só uma, a sociedade ainda vive impregnada de preconceitos.
Sim, a cultura racista e xenófoba está entre nós e nunca é demais denunciá-la e combatê-la.
Neste contexto e na sequência da comoção global que o caso Vinícius gerou, existem alguns pontos que merecem reflexão.
Em primeiro lugar, perante as evidências, que têm acontecido de forma recorrente, fica difícil entender a inacção daqueles que têm o poder e as ferramentas para mudar as coisas.
É incompreensível que as instâncias futebolísticas espanholas argumentem que nada podem fazer quando tinham a oportunidade de, com uma atitude enérgica e punitiva, dar o primeiro passo para o combate ao racismo.
De que servirá a interdição de um sector do Mestalla, se não há impedimento de entrada, no estádio, aos prevaricadores?
Depois temos o posicionamento do Valencia que, num caso idêntico, em que a vítima foi um dos seus jogadores, teve uma atitude condenatória, e agora procurou justificar o injustificável, com argumentação que nem as crianças acreditam.
Em relação à abordagem da imprensa espanhola, nada vou referir por ter sido ridícula e porque, tal como a generalidade da imprensa de todo o mundo, é cooperativista e funciona em função das audiências e não da verdade dos factos.
Agora abordemos a defesa do Vinícius.
A solidariedade da comunidade futebolística, num todo, foi evidente e legítima, mais ainda porque não é norma esse género de empatia no mundo do futebol.
Mesmo assim, não posso deixar passar em claro algumas reacções que foram apenas aproveitamento do clima tenso criado em redor do jogador merengue, numa perspectiva de ganhar a simpatia do Vinícius, e do seu entorno, como que semeando a possibilidade de saída forçada da equipa espanhola.
A repercussão deste caso, que não é único, bem pelo contrário, é recorrente, não só em Espanha, mas em todo o mundo, não pode esconder a realidade mais dura. Isto não é um fenómeno do futebol, ou do desporto, como disseram muitos pseudo-intelectuais, é um problema mais amplo e de dimensão global.
São inúmeros os Vinícius que, no dia a dia, são vítimas de racismo e xenofobia e não têm quem os defenda ou se solidarize. Em favor da luta contra o preconceito racista, não se deve encarar este caso de forma isolada como se, ao resolvê-lo, a sociedade fica curada desta enfermidade.
Também em nome desta luta, que deve ser travada por todos nós, ensine-se a diferença entre racismo e escravatura sem esquecer de explicar que ambos não são exclusivos de uma raça contra outra, porquanto só existe uma raça – a humana – e porque só a verdade pode evitar que haja quem, desinformado, julgue ser dotado de imensa sabedoria e erudição quando desconhece a verdade dos factos.
Lutemos contra o racismo e qualquer outro preconceito. Mas lutemos de verdade porque tudo o que está a acontecer é fruto da permissividade opinativa que as pessoas transportam das redes sociais para a vida real. Saibamos diferenciar a liberdade de expressão da libertinagem. Saibamos defender os nossos direitos, mas também honremos os nossos deveres. Saibamos erradicar a impunidade.
Puna-se todo e qualquer acto racista, seja num evento desportivo ou em qualquer situação do quotidiano. Puna-se também aqueles que usam a violência para impor a sua verdade sobre a dos demais. Puna-se quem desvirtua a realidade em proveito próprio ou da instituição que representa. Puna-se os órgãos e entidades que permitem o desvirtuar dos factos.
Pouco interessa quem dá o primeiro passo, desde que ele seja dado. Pouco interessa o enquadramento penal e criminal a ser aplicado. Caso seja necessário ajusta-se. Mas puna-se sempre que os factos não deixem dúvidas, porque o racismo não vai acabar com o despedimento de um árbitro de futebol, com a interdição do sector de um estádio, ou com o mediatismo de uma vítima.
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